Imagem: G. Rossini-
Semiramide-Arsace-Ah quel giorno
É texto grande de
propósito, e, como numa novela, você pode assistir se quiser. Portanto leia se
quiser...LIBERDADE!
Eu preciso emitir OPINIÃO sobre isso.
E como já vimos isso é bem diferente de apregoar o discurso
de ódio.
Pois bem, pensando na teledramaturgia enquanto um veículo de
comunicação de massa, que tem seu surgimento advindo do gênero Folhetim (século
XIX), foi sendo atualizada no século XX e sofreu ainda mais alterações na
pós-modernidade graças aos auxílios tecnológicos, sendo cada vez mais
interativa e mais dinâmica, agregando mais expectadores (as). Por isso é
importante tecer algumas informações que nos desloquem do senso comum.
Confira nesse video a participação que fiz numa discussão para a Tv Olhos D'Água da UEFS
A primeira delas é que a telenovela brasileira é um produto
que exporta a cultura e seu modo de vida mundo afora. Por ser pensada para
entreter a massa sempre foi marginalizada por intelectuais que a excluíram e
ainda a excluem dos demais gêneros de linguagem e comunicação, como uma prima
pobre e distante dos romances, livros e folhetins por possuir uma estrutura
mais simples, com adjetivações menos canônicas e numa linguagem mais próxima da
realidade da população (num sentido cultural e inteligível), justamente por
isso tenha caído nas graças do povo brasileiro.
A tão falada Rede Globo se aperfeiçoou como poucas emissoras
do país na produção e comercialização das novelas brasileiras. Apostou no
produto, investiu e o retorno tem sido bastante lucrativo, seja através da
publicidade de grandes marcas ou pela possibilidade de ditar moda e
comportamentos, ou ainda pela exportação das novelas brasileiras para diversas
partes do mundo.
Como todos e todas já sabem, não nutro pela emissora a maior
das simpatias e faço mesmo toda uma crítica contundente às suas lavagens (ou a
tentativa delas) por detrás de suas informações e de toda a sua programação,
que serve a uma postura ideológica a qual não me submeto. É lógico que em suas
novelas uma ou várias pitadas sutis (ou nem tanto) desse modo de dominação da
massa também serão tempero pronto.
Porém, gostaria de destacar aqui a parte de utilidade
pública dessas novelas, seja por incentivo da emissora, ou de seus autores.
Muitas pessoas não conseguem criticá-la quando em seu trabalho informativo e
jornalístico, despeja descaradamente em nossas mentes uma predisposição para
conclamar a massa às ruas, incitando a população para o impedimento e ser
manobra de uma elite descontente com o Governo que a emissora nunca engoliu.
Entre escândalos de parcialidade, sonegação de impostos e
pacto com o demônio, nos ateremos às novelas. De Babilônia, que começou na
segunda-feira, sabe-se muito pouco. O que importa mesmo é o seu nome. Situada
na Mesopotâmia, onde hoje fica o Iraque, tem sua tradução mais rasa como sendo
"lugar de conflito, confusão". E é justamente pelo seu nome que
começou toda essa confusão, fazendo jus ao nome. Em seguida, pelo casal gay
interpretado pelas divas da dramaturgia Fernanda Montenegro e Natália Timberg, primeiro
casal idoso a ter um beijo lésbico no horário das 21 horas. Só isso já deu pano
pra manga e para o enxovalhar de críticas. Ninguém se importou com o
assassinato do motorista, muito menos com o comportamento da ninfomaníaca
Beatriz, que já virou meme na internet.
Tudo isso foi abafado pela bela cena de
carinho que faz a arte imitar a vida, a vida imitar a arte e que ao menos nos
traz (ou não) uma reflexão sobre as diversas famílias deste mundo, não enquanto
possibilidades, mas como sendo existentes nessa sociedade nossa de cada dia.
Para muitos essa cena foi ofensiva e uma afronta a moral e os bons costumes da
sociedade de bem e pode, inclusive, incentivar a prática homossexual, transviar
a juventude, etc., etc.
Pois bem, a história das novelas no Brasil sempre trouxe
campanhas interessantes, abordadas como sendo de utilidade pública. Temas como
homossexualidade, racismo, desigualdade social, adoção, DST's, tráfico humano,
exploração sexual, violência doméstica, drogas, doenças, etc., etc., sempre foram
encampados e trabalhados nos mais diversos personagens, denotando
responsabilidade social nas mais diversas obras. E é justamente esse lado
utilitário e reflexivo, em uma abordagem acessível e popular que quero aqui
defender, essa possibilidade de dialogar com o público sobre temas candentes,
tabus, polêmicas. A ideia defendida pelo senhor Marco Feliciano, Deputado
Federal desta república laica e diversa, de que a Globo faz apologia a
"ditadura gay" precisa ser desmascarada. Como, num país em que
homossexuais são assassinados por suas aptidões e escolhas sexuais, vive-se uma
ditadura? Como minha gente, se nem o direito de ir e vir os (as) homossexuais
tem sem serem assombrados pelo medo de ataques homofóbicos de cidadãos e
cidadãs dessa sociedade de bem que não aceita conviver com a diversidade?
Então, cabe à novela mostrar o exercício da tolerância, do respeito, da
naturalização, sim, porque anormal é achar que discurso de ódio é opinião.
Lembro-me de há meses atrás ter escrito em defesa da novela
Meu Pedacinho de Chão, que num tom bem fanático estava sendo demonizada por
algumas denominações religiosas.
Agora é a vez de Babilônia. Que só me remete a música de
Babylon System, de Bob Marley, com ênfase na parte:
"We
refuse to be
What you
wanted us to be
We are what
we are
That's the
way it's going to be, if you don't know
You can't
educate I
For no
equal opportunity
Talking
about my freedom
People
freedom and liberty."
Tradução
"Nós nos recusamos a sermos
O que vocês querem que sejamos
Nós somos quem somos
E é assim que vai ser, se você não sabe!
Vocês não podem me educar
Para oportunidades desiguais
Falando da minha liberdade
Um Povo livre e liberdade!"
E aí fico pensando o que é essa Babilônia e porque a tememos
tanto, se é da confusão que se estabelece uma nova ordem das coisas. Ou se a
Babilônia é um sistema vampiro, que nos cega, que nos impõe e molda segundo
padrões e critérios tão sectários. Eu só sei que da Babilônia eu só tenho
vontade de gritar:
- Rebel,
Rebel!
Tell the
children the truth right now.
E pensar em como podemos nos libertar das opressões que nos
prendem e consomem nossos dias.
Porque a Babilônia é aqui, este império não caiu como muitos
dizem, talvez tenha simplesmente sido transplantado de um espaço geográfico
para um símbolo de um império imponente e que pode ser a representação de um
país, uma cidade, uma casa, uma igreja, um tirano.
E enquanto uma profissional (professora de português e
literatura), eu não posso me deixar levar pelo senso comum de um aloprado
fanático, que vem deste muito tempo chamando atenção por sua luta contra as
minorias e em favor de uma família tradicional que não existe e que
sinceramente questiono se um dia existiu (e olha que eu venho da família
cristã, com papai, mamãe e filhinhos).
E por isso é que irei esperar que a novela me mostre um bom
roteiro, de texto substantivo e com temas polêmicos, um show de atuação, e, se
Gilberto Braga, expert nesse quesito irá temperar a trama com personagens que
nos problematizem enquanto gente, complexos que somos. Viva a teledramaturgia
brasileira, sucesso dentro e fora do país!
E vamos parar com esse mimimi por causa de um beijo gay,
quando a mesma emissora permite um reality show tão vulgarizado como o BBB (vou
usar a sigla pela preguiça de escrever o nome mesmo), no qual é permitido cenas
de sexo, pegação e xingamentos, mas isso não nos choca, por se tratar de casais
heterossexuais. E aí a gente usa o chavão: “Ah, se não gosta desliga a TV.” Mas
quando se trata de um casal gay, vamos fazer campanha pra que o STF- Supremo
Tribunal Federal tire a novela do ar...É, em tempos de marcha pró- intervenção
militar, estamos necessitados mesmo de uma intervenção psiquiátrica, porque
olha...Nunca antes na história desse país se viu tanto conservadorismo em voga.
Esse negócio chamado heteronormatividade complica nossa
vida, viu?! No mais, não quer ver a novela, é simples: não assiste! É assim que
eu faço quando não quero ver uma coisa que não me agrada. Mas não invento
campanha depreciativa querendo impor a minha vontade.
Beijos.
Ana Paula Duarte
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